Especialistas abordam desafios do acesso ao crédito para produtores rurais brasileiros
Custo do crédito agrícola no Brasil é considerado um dos mais altos do mundo, diz especialistas
O acesso ao crédito continua sendo um grande desafio para os produtores rurais brasileiros. O cenário do mercado limita o crescimento e a modernização do setor agropecuário, essencial para a economia do país. Apesar da importância do agronegócio, que representa aproximadamente 27% do PIB brasileiro segundo o IBGE, muitos produtores enfrentam barreiras significativas ao buscar financiamento.
O custo elevado do crédito agrícola no Brasil é frequentemente citado como um dos mais altos do mundo, influenciado pela instabilidade econômica, inflação e políticas monetárias rigorosas. É o que afirmam Tiago Piassum, CEO da Rivool Finance, e Cristiano Oliveira, head of research na Rivool Finance e professor associado na Universidade Federal do Rio Grande.
Segundo ambos os especialistas, os custos de transação no mercado de crédito são consideráveis e difíceis de mensurar, especialmente no Brasil. O patrimônio financeiro bruto da economia, incluindo ativos e passivos com não residentes, alcançou R$ 72,6 trilhões em dezembro de 2022. O saldo consolidado, excluindo posições intrasetoriais, atingiu R$ 59,3 trilhões.
“Os números ilustram a relevância dos intermediários financeiros na economia brasileira e destacam a complexidade e os custos envolvidos nas transações financeiras. A burocracia e a falta de garantia aparecem como obstáculos, e os produtores rurais de pequeno e médio porte têm dificuldades para obter empréstimos. Isso se deve, em parte, à natureza de suas propriedades e atividades, que nem sempre são facilmente valorizadas ou aceitas como colaterais pelos bancos”, explicam Piassum e Oliveira.
Segundo os executivos, o crédito rural no Brasil é altamente dependente de intervenções governamentais, como a concessão de subsídios e programas de renegociação de dívidas. Embora essas medidas sejam essenciais para muitos produtores, elas também resultam em um mercado de crédito distorcido, onde a oferta de recursos subsidiados não é suficiente para atender a demanda total, forçando muitos a buscarem linhas de crédito mais caras e menos acessíveis.
“Nos últimos anos, houve um aumento na participação de recursos não controlados, como as Letras de Crédito do Agronegócio (LCA) e cooperativas de crédito, que operam a taxas de mercado. Contudo, a transição para essas formas de financiamento tem sido vagarosa e enfrenta resistência devido à falta de familiaridade e confiança dos produtores nessas novas ferramentas financeiras”, esclarecem.
De acordo com Piassum e Oliveira, diante desses desafios, é essencial promover soluções que possam democratizar o acesso ao crédito e tornar o mercado mais eficiente. “A adoção de tecnologias financeiras (fintechs) e a criação de novos instrumentos financeiros, como os Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRA) e os Fundos de Investimento nas Cadeias Produtivas Agroindustriais (Fiagro), assim como outros ativos relacionados ao agronegócio, têm o potencial de transformar o cenário do crédito rural no Brasil”.
E continuam: “Os CRAs, por exemplo, são títulos de dívida lastreados em recebíveis de vendas de produtos agrícolas, permitindo que investidores financiem diretamente as operações dos produtores rurais. Desde a sua regulamentação em 2018, os CRAs têm se mostrado uma alternativa atraente para investidores, oferecendo retornos competitivos e ajudando a suprir a lacuna de financiamento no setor”.
Além disso, eles pontuam que a tecnologia blockchain e a tokenização de ativos estão emergindo como ferramentas poderosas para facilitar o acesso ao crédito no setor agrícola. A blockchain oferece transparência e segurança nas transações, permitindo que contratos inteligentes (smart contracts) automatizem e garantam o cumprimento de acordos financeiros. “A tokenização, por sua vez, transforma ativos agrícolas em tokens digitais que podem ser facilmente negociados em plataformas globais, ampliando as oportunidades de financiamento para os produtores rurais. Essas tecnologias não só reduzem os custos e riscos associados às transações tradicionais, mas também aumentam a liquidez e a acessibilidade ao capital”, ressaltam ambos.
Para Piassum e Oliveira, a tokenização proporciona ganhos significativos de eficiência. Embora a implementação dessas tecnologias possa requerer investimentos iniciais e adaptações de sistemas existentes, os benefícios em longo prazo superam os desafios iniciais. A ampla adoção da tokenização pelo mercado pode efetivamente expandir a liquidez, apesar dos custos iniciais de implementação. Além disso, novas tecnologias demandam novos sistemas, e embora a integração possa ser desafiadora, ela promove a modernização e a eficiência operacional.
“Os desafios de crédito enfrentados pelos produtores rurais brasileiros são complexos e multifacetados. No entanto, com a implementação de soluções inovadoras e a modernização do mercado de crédito, há um potencial significativo para superar essas barreiras. A promoção de um ambiente mais facilitado e eficiente para o financiamento rural, impulsionado por tecnologias emergentes como a blockchain, não apenas beneficiará os produtores, mas também a acessibilidade aos investidores e contribuirá para o desenvolvimento sustentável e o crescimento econômico do Brasil como um todo”, finalizam.