Programa de conservação está investindo mais de R$ 110 mi na Mata Atlântica
Programa vai contribuir com a proteção do Bioma no Litoral do Paraná
Com foco na conservação da biodiversidade, a iniciativa busca fortalecer Unidades de Conservação nas esferas pública e privada, a partir da promoção de ações como pesquisa, uso público e educação ambiental a fim de gerar desenvolvimento sustentável no litoral do Paraná; recursos vêm como compensação pela tragédia ambiental ocorrida no Estado há 25 anos
Após 20 anos de muitas lutas e articulações conduzidas especialmente por representantes dos Ministérios Públicos Federal e Estadual do Paraná e organizações do Terceiro Setor que atuam com projetos de conservação e proteção da Mata Atlântica, a maior área contínua do Bioma no Brasil, localizada entre os estados do Paraná, Santa Catarina e São Paulo, está recebendo um reforço milionário para sua preservação.
Com investimento de mais de R$ 110 milhões, o Programa Biodiversidade Litoral do Paraná (BLP), criado oficialmente em 2021, representa uma relevante iniciativa de conservação ambiental do país. A iniciativa, que já está em desenvolvimento e ao longo de 2025 promete ganhar ainda mais celeridade, busca a estruturação de Unidades de Conservação do Estado, o fortalecimento de estruturas governamentais envolvidas na fiscalização ambiental, a proteção dos ecossistemas costeiros e naturais e a promoção de pesquisa voltada para conservação de espécies e ações de educação ambiental, a partir de projetos que sejam estruturantes e garantam um novo modelo de desenvolvimento, mais sustentável, para o litoral do Paraná.
O Programa é financiado por um Termo de Acordo Judicial (TAJ) firmado com a participação direta do Ministério Público Federal (MPF) e do Ministério Público do Paraná (MPPR). Foi assinado em 2012, como compensação pelo vazamento de 52 mil litros de óleo diesel da Petrobras, ocorrido em 2001, que causou sérios danos ambientais a rios, à fauna marinha, manguezais e outros ecossistemas sensíveis associados ao Bioma Mata Atlântica do litoral paranaense.
O derramamento de óleo
O vazamento de óleo que atingiu a região da Serra do Mar, entre Morretes e a Baía de Antonina, foi causado pelo rompimento do poliduto Olapa, que transportava óleo combustível do Terminal Marítimo de Paranaguá até a Refinaria Presidente Getúlio Vargas (REPAR), em Araucária. Embora o duto operasse no sentido litoral–interior, o acidente ocorreu em um trecho da serra, fazendo com que o óleo se espalhasse por áreas de mata atlântica e corpos hídricos da planície costeira.
O impacto ambiental foi severo, com danos à biodiversidade local e contaminação da água, conforme apontaram laudos do antigo Instituto Ambiental do Paraná (IAP) e do IBAMA. Responsabilizada pelo desastre, a Petrobras indenizou o governo do Paraná e comunidades tradicionais, incluindo pescadores afetados. Os recursos vêm sendo aplicados em projetos de recuperação ecológica e restauração dos ecossistemas atingidos.
Os técnicos consideraram o acidente gravíssimo, já que o óleo de alta toxicidade atingiu ecossistemas de extrema fragilidade, onde estão abrigadas espécies endêmicas (que só existem naquela região) e características da Mata Atlântica. O dano ocorreu dentro de um trecho do contínuo mais bem preservado de Mata Atlântica do Brasil, que concentra quase três milhões de hectares do Bioma, em um corredor ecológico que passa pelos estados do Paraná, de Santa Catarina e de São Paulo. Por ser de toxicidade aguda, o óleo impediu a respiração dos peixes, por exemplo, e provocou a morte de incontáveis indivíduos.
Monique Cheker, procuradora da República pelo Ministério Público Federal, reforça que a existência hoje dos recursos, e do Programa, são resultados de uma atuação intensa e constante dos órgãos ambientais, na época o IBAMA mais especificamente, e dos Ministérios Públicos Federal e Estadual, que ajuizaram uma Ação Civil Pública sobre o caso em 2010. “Não fosse a união destes esforços e o apoio das entidades conservacionistas que atuam no Estado, não teríamos hoje esses recursos para investir nas áreas afetadas”, reforça.
Governança e Transparência
No Termo de Ajuste, foi definido que a gestão financeira e operacional do Programa seria realizada pelo Fundo Brasileiro para a Biodiversidade (FUNBIO), organização sem fins lucrativos especializada na administração de fundos ambientais. Já a governança é compartilhada entre diferentes instituições, garantindo transparência, participação coletiva e uma aplicação eficiente dos recursos.
Daniela Leite, gerente do Programa Biodiversidade Litoral do Paraná (BLP) no Funbio, destaca a importância da proposta. “O Programa é uma iniciativa que está estruturada considerando uma governança descentralizada, bem articulada e plural, em que a sociedade civil, órgãos ambientais e instituições de pesquisa têm voz na destinação dos recursos, amparadas pela supervisão dos Ministérios Públicos e uso de ferramentas e procedimentos que dão transparência a todos os processos. Nosso objetivo é garantir que os recursos sejam bem geridos e aportados em ações que efetivamente contribuam para a conservação da biodiversidade do litoral do Paraná”.
Para Monique, do MPF/PR, o envolvimento do FUNBIO na administração dos recursos foi uma das conquistas mais acertadas do TAJ. “Infelizmente, não temos bons precedentes no Brasil de execuções bem sucedidas de valores judiciais. Muitas vezes, esses recursos são depositados em fundos públicos e não necessariamente vão para finalidades ambientais. Esse esforço de conseguir direcionar a aplicação dos recursos, e monitorar esse uso foi uma conquista importante dessa negociação e, agora, temos de fazer boas ações, como aprimorar a atividade fiscalizatória e reparatória, por exemplo”, explica.
O MPF e o MPPR estão acompanhando e fiscalizando todas as ações ao longo do projeto para garantir que os investimentos sejam aplicados de forma eficiente e dentro das diretrizes e determinações legais do TAJ. Além disso, o Conselho Gestor do programa reúne representantes de instituições da sociedade civil e acadêmicas, como ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade), Sociedade de Pesquisa em Vida Selvagem e Educação Ambiental – SPVS, Associação MarBrasil, Mater Natura – Instituto de Estudos Ambientais, Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza, Universidade Federal do Paraná (UFPR) e Instituto Federal do Paraná (IFPR) – campus Paranaguá.
Natasha Choinski, gestora de projetos na SPVS, destaca que o foco das instituições envolvidas na gestão, que sempre lutaram para a conquista dos recursos, é de que o litoral do Paraná tenha condições de se desenvolver a partir de estratégias de conservação da biodiversidade.
“Nossa maior preocupação era de que o valor, proveniente dessa tragédia ambiental, não fosse aplicado em outros fundos de governo que não tivessem como foco principal o investimento em conservação da natureza. É muito difícil termos recursos como esses para investir no que de fato deve ser feito para se recuperar ecologicamente o dano de um acidente como o que gerou a multa. A ideia, portanto, é de que, no longo prazo, esse valor, que hoje é investimento para o território, gere benefícios à natureza, mas que também às pessoas e comunidades do entorno se beneficiem indiretamente, estimulando assim um novo modelo de desenvolvimento que seja conciliatório com a conservação da natureza”.
Camile Lugarini, representante do ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade) no Conselho Gestor do Programa, destaca que as unidades de conservação federais do litoral do Paraná serão beneficiadas com cerca de 50% do recurso disponibilizado. “O ICMBio se envolveu em todo o planejamento estratégico do Programa, desde o início. Teve grande relevância, inclusive, na formatação do planejamento da proposta como ela se configurou. A partir desses investimentos, será possível melhorar muito a condição de Unidades de Conservação do Paraná, por meio da estruturação das Unidades de Conservação, integração entre diferentes instituições que fazem a proteção ambiental no Litoral do Paraná, além de buscar a apropriação da conservação da natureza pelas comunidades locais, por meio da valorização do meio ambiente e do patrimônio cultural e histórico, do turismo de base comunitária, do uso sustentável dos recursos naturais e da governança sobre o território”, destaca.
O Programa funciona por meio de investimentos em projetos submetidos a editais ou de projetos estruturantes, geridos pelo FUNBIO, os quais podem ser apresentados por organizações da sociedade civil e por instituições públicas envolvidas diretamente com a conservação ambiental, tendo como eixos temáticas como fiscalização ambiental, gestão de unidades de conservação e pesquisa e monitoramento da biodiversidade. Os projetos selecionados serão acompanhados tanto na parte técnica como prestação de contas, assegurando transparência e correção no uso dos recursos e a efetividade da destinação para a preservação ambiental.
Frentes de atuação
O litoral do Paraná abriga uma biodiversidade única, mas enfrenta desafios como desmatamento, tráfico de animais silvestres, poluição e ocupação irregular. Para lidar com esses problemas, o Programa vai atuar em diversas frentes, principalmente em fortalecimento, estruturação e manutenção de Unidades de Conservação (UCs) federais e de Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPNs), abrangendo cerca de 430 mil hectares de ecossistemas costeiros e florestais. Ações de educação para a conservação e estímulo à pesquisa, a partir de programas educativos e científicos voltados à preservação, e recuperação de áreas degradadas também estão entre as ações prioritárias do Programa.
Ascom